Monday, November 20, 2006

Rejeição!!!


Eu confesso, tenho problemas com rejeição! Sou do tipo que, se você cumprimenta sempre com um idêntico ‘olá’, e resolve falar um dia, para variar, algo diferente, como um ‘oi’, ficarei me remoendo perguntando porque você, seu canalha filhadamãe, não vai mais com a minha cara.

Tanto que é por isso que virei funcionário público. Morro de terror em pensar que eu poderia ser hoje ‘garção’ num rodízio de churrasco: a cada mesa em que eu oferecesse meu espeto (no bom sentido) ficaria suando frio imaginando a possível resposta ‘não’ do freguês. Imaginando se ele rejeitou a picanha porque não foi com a minha cara, porque percebeu pela insegurança da minha voz que eu estava com medo daquilo e resolveu tirar um sarro, se rejeitou os coraçõesinhos de galinha porque eu sou sobrancelhudo demais para o gosto dele. Pior ainda se me entregassem o espeto com o abacaxi para correr pelas mesas!!! Aí seria terrível! Insuportável! Jamais teria certeza se o dono da churrascaria fez isso porque tá na cara que sou inferior, ou seja, sou do tipo que pode levar o abacaxi de mesa em mesa só para levar um ‘não’ na cara. Eu ficaria horas procurando entonar a voz da maneira certa, escolher a frase milimetricamente correta ("O senhor aceita um abacaxi?" ou "Vai um abacaxizinho aí?") para encontrar o modo mais firme, mais decidido, quase coativo, de oferecer o espeto de forma irrecusável. Talvez eu cogitasse de levar um 38 na cintura.

Tanto tenho complexo de rejeição que é por isso também que não sigo a tradição da minha família e não viro cobrador de ônibus. Já até imagino: se eu sempre trabalhasse na mesma linha (digamos o T5), aqueles passageiros habituais, talvez depois dos primeiros dias, poderiam começar a dar notas altas, para me dificultar o troco. O magrão, que pega o bus todo dia às 7:00 da manhã, poderia vir com um sorriso malandro na cara, entregando uma nota de 50 ou 100 pila para pagar a passagem de R$ 1,85. Tudo porque saberia, pelo meu jeito, que eu jamais rejeitaria um passageiro por causa do troco (com medo de ser rejeitado) e o deixaria pular a roleta.

Aliás, falando em ônibus, foi por isso que eu comprei um carro. É, eu era do tipo de passageiro que morria de medo de ficar sozinho na parada. Não, não era medo de assalto: era medo do motorista do busão não parar para mim. Lá estava eu na parada, solito, e o ônibus vindo, vindo. Estendo a mão, o motorista olha minha cara de enjeitado, e decide passar reto. Não me quererem como passageiro do ônibus: esse era meu medo. Eu sempre ficava pensando qual seria o melhor meio de fazer sinal com a mão para o ônibus parar: esticar o braço todo de um modo decidido (mas aí o motorista poderia pensar que estou lhe ordenando, que sou imperativo, arrogante, e decidiria não parar) ou estendê-lo suavemente, em ângulo obtuso com o corpo, balançando ligeiramente a mão (mas aí o motorista poderia pensar que eu sou um fraco inseguro, e só de sacanagem decidiria não parar)? E qual a distância para começar a fazer o sinal: quando o ônibus está a 100 metros da parada (mas aí o motorista teria tempo para pensar se me pega ou não, e poderia escolher a segunda opção) ou à 10 metros (mas aí ele teria de freiar de bruscamente, e poderia decidir que os discos de freio do ônibus são mais importantes do que me pegar na parada)? E o pior seria se, caso o ônibus não parasse, ele estivesse lotado de passageiros, e todos olhassem para a parada, a fim de ver quem é o néscio que foi rejeitado até pela EPTC! Já cheguei a um dia, quando estava eu e uma velhinha na parada, pegar o mesmo ônibus que ela, embora ele fosse para a Restinga e eu quisesse ir para o Centro, só para não ter que ficar sozinho na parada.

Mas o carro também tem seus inconvenientes. Quando estou no semáforo, sempre odeio quando o guri que pede esmola ou vende balas passa reto pelo meu automóvel e vai pedir trocados ao motorista do lado! Mas como, ele acha que eu tenho cara de 'unha de fome'? Que não vou ter grana para comprar as balas? Que desaforo!

Enfim, até andar a pé é problemático. Por exemplo, essas pessoas que ficam distribuindo papéis publicitário nas esquinas: se as vejo a um quarteirão de distância, torço para nossos olhos não se encontrarem, pois é muito provável que elas decidam dar o papel para o sujeito na minha frente, mas simplesmente me pular na hora de distribuir o papelsinho da propaganda da Mãe Joana de Ogun (veja, em geral, essas videntes anunciam que curam dor de corno, seborréia, verruga, penúria financeira, varizes, mau hálito e o escambau, mas jamais complexo de rejeição! O que elas tem contra mim?) ou propaganda daqueles “Corte o cabelo por R$ 1,99” (O que esses caras tem contra meu cabelo? Acham que não merece ser cortado pelas ‘talentosas’ mãos do seu barbeiro???). Talvez da próxima vez que andar pela rua eu leve um 38.

Vou terminando por aqui meu desabafo, pois acho que ficou longo demais e todo mundo deve ter deixado de ler há muito tempo. Mesmo sabendo que isso é verdade, e que eu poderia ficar escrevendo mais por duas horas a fio um monte de confissões, ainda assim existe a possibilidade de que alguém esteja ainda lendo, por ter se indentificado com minha história, reconhecido seu oculto complexo de rejeição. Bem, se isso é verdade, e você ainda está aí, deixa eu me vingar de todos os anos de temor, em cima de você: Cai fora, seu freak! Esse texto não é para você, seu doente cheio de complexos! É para pessoas normais, como eu! Pare de ler, imediatamente!

5 comments:

Vivi said...

Bah, eu li até o final: não consigo superar meu jeito lingüiça de ser... Mas eu não tenho medo de ficar sozinha na parada, sabe?! Tenho é verdadeiro pavor de atravessar a rua, caso o sinal já esteja fechado há algum tempo. Não consigo suportar a idéia de que o sinal fique verde enquanto eu estiver passando na frente dos carros. Tenho certeza de que vou ser atropelada sem qualquer compaixão.

Victor said...

vruuumm.. vruuummm!!! Bee-beep!

Dona Spirulina said...

Muuuito engraçado!! Me identifiquei total com a história do "oi"!

Deni Meyer said...

Hehehehe...ah, não é à toa que estamos todos no mesmo blog!!
Acho que o pânico de rejeição é um pré-requisito para ser lingüiça.
Eu faço como você, Viviane, fico disfarçando na esquina até abrir o sinal e os carros arrancarem e só quando o sinal fecha de novo eu atravesso. Além disso, toda vez que alguém está estranho eu acho que a culpa é minha...eu fiz ou disse alguma coisa. Na verdade eu acho que isso é uma coisa meio egocêntrica ao mesmo tempo, né? Sei lá, achar que tu és tão importante que tudo é culpa tua...quando na real tu sequer foi lembrado...snif...é punk ser uma lingüiça, viu?!

Nessita! said...

gente, complexo de rejeição é algo monstruoso... Nunca pensei nessa história da parada de ônibus, nem nisso dos ois, nem nada. Vou ver se trabalho meu complexo para chegar a esse nível hehehehehe